segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Cape Town - Johannesburg - São Paulo

Hoje é meu último dia na África. Resolvi acordar bem cedo e subir a Lion’s Rock seguindo a dica de Ronnie. Ontem na saída de Water Front - beira mar de Cape Town - acertei com o taxista para me levar ao acesso da trilha. Ele é um senhor de 71 anos chamado Errol, ex-corredor de maratona que uma vez por semana faz um incrível trekking de 5 horas de Water Front até Devil’s Rock, subindo pelas encostas da Table Rock. Cerca de 20 Km.

Errol resolveu me acompanhar na subida da Lion’s Head ainda de madrugada. Eu não poderia ter melhor companhia. Estacionamos na entrada da trilha e iniciamos a subida em bom ritmo. Desde o início já imaginei que o velhinho era uma pedreira. Ninguém corre maratona a toa. Ele me disse que correu quatro vezes uma corrida de 100 Km aqui na África do Sul. 100 Km?! Errol estava realmente em boa forma e precisou menos 40 min para atingir o cume. Eu usei a boa desculpa de parar para algumas fotos daquela paisagem incrível o que me deu fôlego extra, chegando pelo menos 15 min depois. Na descida cruzamos gente da cidade que faz ali pela manhã seu exercício diário, principalmente mulheres jovens que Errol - um homem divorciado e de bem com a vida - não deixou passar alma viva em brancas nuvens. Tinha sempre um cumprimento diferente ou algo interessante a dizer que inevitavelmente provocava sorrisos. Na verdade, ele dava sempre um jeito de fazer elogios da maior elegância. Vi que tinha mesmo o que aprender com o aquele senhor.

Para chegar no cume da Lion's Rock é preciso fazer algumas escalaminhadas próximas ao desfiladeiros que dão aquele friozinho na barriga e subir algumas escadas chumbadas em trechos estratégicos. Uma vista de 360º recompensadora de toda cidade apresenta as montanhas que localizam estrategicamente CT no extremo sul da África do ladinho do Cabo da Boa Esperança e fazendo as honras do encontro das águas entre o Atlântico e o Índico.

Cada lugar transforma um pouco você. Assim aconteceu comigo nas trilhas das serras do Brasil, nos desertos e montanhas do Chile e Peru, na Espanha, na Austrália e outros países que estou tendo o imenso privilegio de conhecer nesta vida. Mas a África me marca agora de uma maneira diferente. Talvez pela forma com que tive contato com a terra, a vida selvagem e principalmente sua gente. Não volto o mesmo para casa. Foi esta "diferença" que vim buscar. É isso que levo daqui.


Cape Town - África do Sul - 2o dia

Felizmente dei sorte mais uma vez. Sou abençoado. Faz um dia lindo em CT e consegui ir onde queria fazer minhas fotos. Estava ancioso. Passei a manhã na Table Mountain onde fiz uma linda trilha no alto dos 1.074 m da montanha. A tarde tomei um ferryboat e fui conhecer a prisão onde ficou o Mandela na Roben Island. Histórias para não esquecer dos absurdos onde chegou a humanidade.

A noite conversei com o Jean-Claude que trabalha no hotel. Ele tem 2,06 metros e nasceu no Congo. Fala francês e aprendeu Swahili e ingles no Quênia para onde foi alguns anos atrás fugindo da guerra civil em seu pais. Jean-Claude fugiu durante anos sem parar antes de chegar no Quênia. Foi preso várias vezes e em uma delas ficou três meses dormindo de pé uma cela lotada. Ele me contou que suas pernas e pés incharam ao ponto de não conseguir caminhar quando foi solto. Depois de algum tempo conseguiu fugir a pé para a África do Sul até cruzar a fronteira, foi preso novamente e por fim liberado para tentar a vida na condição de refugiado de guerra. O pai de JC era um médico no Congo mas foi morto na guerra devido a sua posição política. É aqui em Cape Town, uma cidade linda mas cheia de contrastes, que hoje vive Jean-Claude, sua mãe e irmã, seguros e dignos novamente. 

Cape Town - Africa do Sul - 1o dia

Hoje é segunda, dia 25 e estou voando de volta a Johannesburg de onde sigo para Cape Town. Preciso esperar meu vôo até quarta e um monte de gente disse para eu seguir para CT. Eu reservei um passeio a Roben Island para visitar a prisão onde Mandela esteve preso. Se der tempo quero subir duas montanhas que circundam a cidade e têm bom acesso: Table Mountain e Lion's Rock. Descobri estas atrações através de Ronnie Harris. Ele é um cara bem aventureiro e comentado entre os companheiros pela força e resistência. Está na faixa dos 55 anos. Correu maratonas, subiu um vulcão no Equador, o Kilimanjaro na Tanzânia e uma porção de coisas pelo mundo a fora. Ronnie é o cara.  Sempre me contando de suas viagens e aventuras e me dando ótimas dicas. Foi ele que veio com o James na bicicleta de dois lugares. Se a travessia foi difícil em uma single, imaginem em uma bicicleta dupla com um dos residentes de Norwood. Na terça-feira em Cape Town devo encontrar a filha dele para jantar. Ela está lá fazendo um trabalho voluntário em uma favela da cidade. Foi o próprio Ronnie e articulou para ela. Há anos ele viaja à África e se envolve nas causas locais.

Cheguei à tarde em CT e fiquei em um lodge instalado em uma antiga residência em Sea Point. Um confortável lugar muito bem cuidado pelos donos e bem avaliado nos sites de busca com comentários de viajantes. Depois de me instalar em um acolhedor dormitório coloquei uma bermuda e fui caminhar pela orla até Water Front. A idéia valeu fotos bacanas do mar mas ventava muito e passeio frio com roupa de verão. O funicular (cable car) que levava a Table Mountain estava fechada devido aos ventos. Dormi cedo apostando no dia seguinte. Aproveitei e tomei o segundo comprimido contra a malária com a certeza de sonhar bastante.

Do Quênia para a África do Sul

Hoje o dia foi de espera pelo vôo de volta a Nairobi. Não achei como ir direto de Mombasa de volta a Africa do Sul. Mombasa é menor que Nairobi, mas com favelas, casebres e barracos de comercio por todos os lados. Na verdade uma ilha que na parte oceânica tem resorts. A água do mar é quentinha e há muita alga. Coqueiros e corvos fazendo aquele barulho sinistro.

Na chegada no aeroporto de Nairobi, novas emoções. Despedi-me do povo. Fiquei na saída da esteira de bagagens com o Ronnie e fui abraçando e me despindo de pessoal. Ganhei um beijo do James bem caprichado e devolvi um. Ele sempre beijava o Ronnie e Jeff, seu pai. Me senti o máximo. Foram passando Danny, David, Judith, Berry, Paul Goldman, Joe, Nigel, Paul, os garotos, Benjamin, Michael e Iris, dos que lembro agora o nome de memória. Eles perguntaram se voltaria nas próximas travessias e me desejaram boa sorte. Ronnie olhou para mim com seu jeito decidido e firme e me disse: “take care man”. I will, Ronnie. 

Voltei ao Boulevard. Preciso passar a noite e acordar bem cedo para  iniciar o regresso pela África do Sul, onde a escala para o Brasil é obrigatória. Agora sozinho a sensação é estranha. Fiquei cercado de muita gente um bom tempo e isso me fez bem. Estou focado para que der tudo der certo e a volta seja tranqüila. Mal consigo dormir.. 


6o e 7o dia de travessia - fotos






6o e 7o dia de travessia

Nos últimos dias da travessia observamos a paisagem mudar. Mais úmido, o céu de Sol intenso dos últimos dias deu lugar a nuvens e chuviscos a medida que nos aproximávamos do litoral em direção a Mombasa, nosso destino.


A esta altura eu já começava a sentir saudades do Quênia e dos amigos de bicicleta, tendo a certeza de ter vivido uma experiência única na vida. Não sei se vocês sentem quando isso está acontecendo mas eu sei exatamente dentro do meu coração quanto vivo momentos que não devem se repetir. E vivi exatamente assim nos últimos dias. Isso me dá uma sentimento de realização e ao mesmo tempo de nostalgia, como se a vida fosse um filme que passa uma vez e precisa ser visto da maneira mais plena e límpida possível, com olhos e espíritos bem abertos.


No último dia intenso nos deparamos com um terreno mais acidentado, com muitas subidas e descidas curtas. Com mais areia, acidentes e paradas foram freqüentes. Novamente muitas escolas e crianças com seus sorrisos brancos. Neste dia registrei o que considero a melhor imagem de por de Sol de minha vida. Aquele vermelho sangue Africano. Sem filtros ou ajustes no computador as cores são únicas e estão gravadas na memória. Vou postá-la a seguir.


No resto do sábado tivemos o merecido dia de descanso com direito a visão do mar bem na nossa frente. O oceano Índico, a areia branca, a água límpida e quente com algas, os coqueiros, as pessoas humildes. Aquilo tudo me lembrou de João Pessoa, onde nasci e me fiz gente.


A noite tivemos uma festa de despedida com direito a música e diversão. Gordon Fox fez um lindo discurso cujas palavras tocaram meu coração. Lembrou bem do nosso propósito no Kenya Challenge e o incrível trabalho da Norwood e as muitas maneiras pelas quais podemos fazer o bem ao nosso semelhante.

5o dia de travessia - fotos e vídeo